sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Uma semana de Mostra AMP


Foto tirada por Daniel Christino

Chegamos à metade da V Mostra O Amor, a Morte e as Paixões. Seguem algumas notas sobre essa primeira semana de muito filme e alguma correria.

Digital vs. película

Rola até uma certa apreensão antes do filme começar: "Será digital ou película? Digital claro? Película boa?". O digital domina, não há dúvidas, tendo algumas projeções decentes (L'Apollonide), outras muito ou totalmente problemáticas (O Porto, Habemus Papam). É um novo meio de se ver filmes na sala de cinema, arquivos e nuvens no lugar de rolos e cigarette burns, e as mostras (seja aqui, SP ou Rio, pra ficarmos no Brasil) já adotam isso há algum tempo.

Aqui, se não em número, a película leva uma vantagem básica: o risco extremamente menor de ter o filme travado ou o som estourado, engasgadas sofridas pelos filmes de Meus Documentos. Além disso, também costuma ser exibida na tela completa, preenchendo todo aquele campo visual. A exibição de Gainsbourg - O Homem que Amava as Mulheres na sala 2, a de maior tela junto com a 4, foi a mais bonita que vi aqui, comigo sentado na quarta ou quinta fileira, vendo tudo muito grande na minha frente, um filme que eu talvez tivesse gostado e sentido menos se tivesse visto em casa, na TV ou no PC. Laetitia Casta de Brigitte Bardot é uma paixão que tenho como gigantesca.

Riscados, leves tremidas e desfoques nas mudanças de rolos, barulhinhos típicos... Não é só questão de charme na película, mas também a impressão de que o filme não é só um objeto, mas um ser vivo, com, de fato, tempo de vida. Em boa parte, cinema é isso sim.

Ainda continuo achando esse digital todo consideravelmente escuro, salvo poucas exceções. Tio Boonmee que Pode Recordar Suas Vidas Passadas, Turnê, Deixa Ela Entrar, Tetro e Luzes na Escuridão, Inquietos, Um Conto Chinês, filmes muito aguardados na Mostra, são em película.

Público

Saiu hoje a notícia de que o público já é maior que a da última edição, realizada em 2004. Continua momento ótimo pra conhecer, encontrar e reencontrar pessoas que dividem um mesmo interesse, por cinema e por filmes específicos. É uma mostra que acontece na praça de alimentação de um shopping, curiosa combinação de consumos e às vezes a sensação de que estou preso no Big Brother de Dead Set, aquela série britânica que misturou reality show e zumbis.

Também continuo sem entender como muitas pessoas não conseguem movimentar os pés e cruzar as pernas sem dar severas bicudas na poltrona da frente. Há espaço pra isso. Eu consigo. E cruzo muito as pernas.

Pessoas falantes são, claro, um clássico. Nesse ritmo de três, quatro sessões diárias, é fácil sentar perto de um. Quando é na frente ou atrás de mim, consigo pedir silêncio. Quando é do meu lado, não sei o que acontece, não é tão fácil de falar, a não ser em casos extremos. Na sessão de Gainsbourg, um casal ao meu lado comentava bastante, quase sempre partindo dele, rapaz muito interessado em impressionar a garota com o quanto ele conhecia da vida de Serge. Cara, tu já tava pegando, não precisa fazer esse peitoral de pombo ali, deixa pra depois.

Debates

Começaram anteontem, dia 01/02, os debates sobre certos filmes, sempre depois de uma das sessões (das 19h). Hoje será debatido Tio Boonmee que Pode Recordar Suas Vidas Passadas. O restante da programação pode ser conferido aqui: http://www.mostradecinema.com/programacao.html

O debate de ontem, sobre Inquietos, se revelou interessante para um filme que me irrita de algumas boas maneiras. Um momento da discussão, já aberta ao público, me lembrou exatamente de uma fala do (ex-)crítico e cineasta Kleber Mendonça Filho, escrita na sua cobertura pessoal do último Festival de Cannes:

‎"Me chama a atenção como a discussão em torno de um cinema de autor no Brasil fica, muitas vezes, restrita à questão do mercado. O filme autoral como prova de que não é comercial. Um rótulo que identifica, preguiçosamente, toda uma casta de filmes que são pouco vistos, ou que não são lançados, ou que são feitos com pouco dinheiro em novos formatos de produção. Talvez falte discutir mais um sentido real de autoralidade, o que enfocar, o que filmar, como o realizador é fiel a ele mesmo traduzindo sua visão para o cinema, seu comprometimento com aquilo."

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