quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Pacific Rim



Desde os trailers de Pacific Rim ("Círculo de Fogo" aqui no Brasil, 2013), um amigo dizia que Guillermo del Toro poderia estar oferecendo uma espécie de resposta a Transformers, a coisa mais insuportável de todas as coisas insuportáveis já feitas por Michael Bay. A comparação, de fato, procede.

Lembro de quando vi Transformers 2 (2009). A trilogia é um amontoado de barulho e destruição aleatória, a parte 2 sendo o pior deles. Ao final da sessão, poucas poltronas à frente levantava um garoto muito empolgado, aplaudindo. Eu me sentia como se tivesse saído de uma coqueteleira, mas o menino parecia ter se divertido, talvez porque a lógica do "quanto mais rápido, mais veloz" esteja cada vez mais presente e mais associada a uma ideia de diversão, a ponto de, hoje em dia, espectadores não conseguirem assistir a um filme no cinema sem parar para checar a telinha do smarphone vez ou outra. Se o blockbuster não tiver uma velocidade cretina, o sujeito vai dar uma checadinha no Facebook. Esta é a impressão que se tem durante um filme de Bay, que lhe enfia uma colher de grude antes que se possa ter qualquer noção de sabor da colherada anterior. É só ver a picotagem alucinada de suas montagens, que, sem demora, não se importam com qualquer concepção de sentido. É anestesiante.

No filme de del Toro, por sua vez, a Terra é invadida por monstros gigantescos de outra dimensão e precisa investir em robôs colossais para sobreviver aos ataques. Os clichês surgem quase como bolas cantadas num jogo de bingo, pois são evidentes e aparecem até completar uma cartela de obviedades que vão desde a superação de traumas do passado ao desfecho tipicamente feliz com o casal sobrevivente. Os personagens parecem se relacionar na dinâmica de uma produção highschool - há um maromba praticante de bullying, vejam só -, calculados na matemática mais básica. Até aí, pouco se diferencia de qualquer produção de Jerry Bruckheimer.

A sensação de resposta não só aos Transformers, mas de toda essa incansável quebradeira generalizada, em que a vontade de mostrar a capacidade de acabar com cidades inteiras parece ser o objetivo final dos atuais blockbusters hollywoodianos (GI Joe, Os Vingadores, O Homem de Aço...), vem, primeiramente, de planos mais longos que o costume para esse tipo de produção, evitando a mania da montagem esbaforida do corta-corta-corta antes que se passem dois ou três segundos de alguma imagem lembrável.

O que del Toro faz é filmar com algum encanto, um deslumbramento juvenil. O ângulo geralmente baixo tem algo do olhar de criança, um pouco como a mágica aparição do brontossauro em Jurassic Park (1993), de Steven Spielberg. Sua câmera é contemplativa, de alguma forma fascinada por esses mechas humanoides e criaturas oriundas de um universo que revela o eterno flerte entre o cineasta e a obra de Lovecraft.

Mesmo a ação em si, que presume uma destruição urbana colossal (são gigantes, afinal), parece ser mais focada. Parte dela ocorre em pleno mar, e, quando em meio a ruas, prédios e civilização, o movimento de "corpos" se impõe, às vezes sugerindo que Pacific Rim seria uma espécie de confronto entre gladiadores, até mais que aquele recente Gigantes de Aço (2011). A imagem de um robô arrastando um navio como se fosse um porrete é exemplo muito forte nesse sentido.

A cena da invasão de Sydney, na Austrália, é particularmente interessante. Num plano muito aberto, percebe-se que o monstro que a ataca é de alguma forma parecido com a Opera House, o grande centro de artes da cidade. Essas criaturas, assim como as máquinas robóticas, são elas próprias filmadas como construções arquitetônicas. O que temos aqui é uma aposta completa no apuro visual, sem receio, inclusive, de se prestar a coloridos fluorescentes.

Temos aqui, enfim, um brinquedão de tato e visão. Na sua raiz, está também uma cara homenagem ao (sub)gênero de monstros gigantes, ninho de Godzillas e Gargantuas, empenhadas tosquices dos anos 50 e 60. Não deixa de ser um blockbuster, e um desses sem muito fôlego industrial, aquém de suas expectativas de sucesso (custou 180 milhões de dólares, tem arrecadado, até então, mais ou menos o dobro, pouco para os padrões). O prazer está nos momentos em que del Toro acredita que até para fazer quebra-quebra é necessário um mínimo de embelezamento.

Achei um barato e não faço ideia de como aquele garoto da sessão de Transformers 2 reagiria ao filme.