quarta-feira, 21 de abril de 2010

Como Treinar Seu Dragão




Dragão dócil, filme meio rebelde.

A figura do dragão é uma dessas que parecem atrair pessoas de qualquer canto do globo. Existe em ampla mitologia, do bíblico ao oriental, tendo encontrado forte reforço em tatuagens e jogos de RPG. Um tipo réptil alado, dragão virou sinônimo de poder e intimidação, com algo estranhamente sexual no meio. Como muitos outros seres (mitológicos ou não), o dragão é visto pelo Cinema como bonzinho ou vilanesco. O de Como Treinar Seu Dragão, animação da DreamWorks, revela-se do bem.

Em primeira mão, o filme oferece exatamente o que se espera: relação amistosa entre um dragão e um humano, também recorrente no Cinema. Melhor exemplo talvez seja o primeiro A História Sem Fim, em que um garoto voava sobre um dragão-cachorro felpudo e amigão. Entre os piores temos Coração de Dragão (aquele com dublagem de Sean Connery lá e Miguel Falabella aqui) e o recente Eragon, um desastre. A lógica mostra que jovens no meio geram possível amizade entre as duas espécies.

A amizade em Como Treinar Seu Dragão é bem construída, com boas introduções e uma paciência relacionada a estudo e aprendizagem na relação entre o menino carismático Soluço e o pequeno dragão poderoso Banguela. Contra todas as expectativas (incluindo as do pai, dublado por Gerard “Só Faço Papel de Guerreiro Truculento ou de Apaixonado Retardado” Butler), o garoto aprende na unha e na escama a como tratar dragões em vez de matá-los (a princípio, são ameaça), um costume da ilha viking do filme, que treina caçadores ainda crianças. Existe até um viking gordinho nerd, armado com informações numéricas. O humor aqui é dos bons.

Esse exercício de ternura trabalha a domesticação de maneira bem aceitável. As criaturas são bizarro-fofuras que tendem levemente ao dócil. Tanto em design quanto em trejeitos, Banguela é xerox do alienígena Stitch de Lilo e Stitch, só que em versão alada. São os mesmos diretores, Dean DeBlois e Chris Sanders, então a associação é certeira e não há crime. DeBlois também dirigiu Heima, longa sobre a banda Sigur Rós, praticamente um desses filmes-pra-DVD, mas maravilhoso de um jeito quase espiritual não-maculelê. Surreal pensar nisso, mas, de certa forma, até que Sigur Rós daria o tom para a animação (vide créditos finais).

Visual geral de Como Treinar Seu Dragão é digno de atenção especial. A consultoria do diretor de fotografia Roger Deakins (colaborador dos irmãos Coen) parece dar mais textura do que a própria máquina de venda atual que é o 3-D. As imagens destacam a terceira dimensão, mas a luz dessa animação é uma coisa. Sequência de ação final é um espetáculo a parte nesse sentido. Contudo, é engenhosa não apenas na grandiosidade e beleza, mas também como clímax de um peso dramático trabalhado e carregado até o fim, quando já abraçamos voluntariamente o ideal de amizade representado por dragão e menino protagonistas. Dessa sequência vem conseqüência, uma porção de ousadia para distinguir a animação com uma lição acompanhada de duro aperto. Pode haver choro.

* post escrito ao som de "Pedaço de Mim" - Chico Buarque.

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